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trabalho na frança como Game Designer. aqui conto historias que acho interessantes. os assuntos sao geralmente cinema e video games mas nao apenas. de forma alguma.


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o leitor ideal do shiny gun é alguém que não lê blogs.

para todos os que não se enquadram e acham meus posts pequenos, segue um extrato acadêmico. lembrem-se, pra sair é só apertar o "X", não tem prova amanhã.

No final do século XX, a revolução digital das mídias aumentou ainda mais o poder de comunicação entre os homens, comunicação que pode ser considerada uma forma de ?presença à distância? (WEISSBERG, Jean-Louis). Essa presença é a criação de um simulacro do outro, uma forma de ação em lugares onde não estaríamos, uma extensão virtual de nós mesmos que é, ao mesmo tempo, perceptível e irreal, é som, imagem, cheiro, cada vez mais elaborada, mais detalhada mas que não é o encontro ?real?.

Essas presenças digitais se tornam cada vez mais freqüentes, diminuem espaços, vencem oceanos, o próprio tempo (a gravação digital não se deteriora) e são infinitamente reproduzíveis, sem nenhuma perda de qualidade. Sua força de convencimento é cada vez maior, proporcional também à sua qualidade, sua verossimilhança. Esses fatores, agindo conjuntamente: verossimilhança, reprodutibilidade e vulgarização (e-mail, celular, fax, programas de mensagens instantâneas, tv; a imagem não-local está por todo o lado), agindo juntos, abrem a possibilidade de utilização desses meios para a criação de uma ilusão de realidade, para uma realidade manufaturada, aos moldes do filme de Michael Douglas, mas realizada dentro da comunicação digital, em sua escalada de verossimilhança..



Em jogos normais, o universo de ação é limitado, assim como as ações (ou as possibilidades) do jogador. Ao hackear uma página do jogo, o jogador está realizando uma ação imprevista, uma ação criada por ele mesmo, o jogo se transforma em invenção, em criação coletiva, tanto do jogador quanto do mestre. Em outro jogo do mesmo tipo, a história (fictícia) era sobre uma empresa que realizava experimentos químicos perto de uma pequena cidade americana. Os jogadores foram descobrindo evidências de que esses experimentos seriam ilegais e perniciosos aos habitantes da cidade. Em determinado ponto, eles processaram a empresa fictícia e deram indicações de todas as provas já arquivadas. Não era esse o final previsto da trama pelos realizadores mas, percebendo que, realmente, as evidências eram mais que suficientes, o jogo foi considerado terminado.

A língua é criada a partir de uma dinâmica entre seu uso e sua estrutura. A gramática existe como referência mas seu caráter de ?ente vivo?, seu uso cotidiano, obriga a mudanças na própria teoria. Essa tensão a mantém em movimento, em constante mudança, novas palavras e significados sendo criados a partir de seu uso. O jogo, se considerado como linguagem, implica uma simplificação excessiva do seu conceito. Como em jogos normais toda a possibilidade de ?fala? do jogador está dentro do quadro de ?palavras? determinado pelo autor e seu uso definido pelas regras, deixa essa fala extremamente limitada e a qualificamos ?enunciado?. No caso descrito acima, ela ganha autonomia de fala, ela vence as barreiras previstas pelo autor e ele deixa de ser proprietário do código, este passa a ser autônomo, propriedade daquele que obtem melhor uso. Seria como se no jogo de ?Street Fighter? pudéssemos, como jogadores, inventar golpes.

O jogo The Beast, então, quebra, assim como o jogo do filme de Fincher, a regra de ouro de Huizinga. Ele retira o jogo de um espaço limitado e definido e o transporta para a realidade. O próprio jogo é descoberto por abduções (ECO 1998), e seu desenrolar vem a partir da comprovação da acuidade dessas abduções. O jogo é um exercício de lógica e dedução, ele é transmitido em um plano diferente, simbólico. No jogo de Huizinga, o jogo é um universo simbólico estabelecido, onde só sabemos jogar depois de apreendermos seus significados.

No jogo The Beast, o ato do jogo é uma interpretação constante dos símbolos apresentados e a tentativa de validadação de modelos através dos quais tentamos interpretar os signos que nos chegam através dos canais de comunicação mais insólitos. O funcionamento pode ser bem explicado pelo sistema de REGRA, CASO e RESULTADO, relacionado à interpretação dos signos (memes) do jogo. No jogo clássico o raciocínio possui uma REGRA estabelecida, um CASO estabelecido e atingimos o RESULTADO através do raciocínio. O bispo, no xadrez, se move na diagonal (regra), o cavalo adversário se encontra em uma das diagonais da casa que o bispo ocupa (caso) e bispo toma cavalo (resultado). Este é um processo de dedução lógica semiótica, como descrito em (ECO 1998). Quando entramos numa página de internet onde está arquivado o diário de um personagem do jogo estamos diante do resultado. A aplicação de possibilidades diferentes de regras e casos para encontrar a mensagem: olhar a página em código html, para ver se a mensagem não está escondida no meio do código, não aparecendo na visualização do browser; ou selecionar uma área vazia da página para ver se a mensagem não está escrita na mesma cor do fundo da página, são tentativas de abdução ou indução, o caminho contrário do raciocínio simbólico que temos em jogos normais.